quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Idéias de consumo de uma dedicada mãe

Escrever é um processo que nasce das urgências. Um desabafo, um canto, um choro, uma gargalhada, uma declaração de amor. Na incerteza de que serei mesmo ouvida ou na falta de alguém que me ouça agora, escrevo. Por exemplo, hoje estou com a palavra “vibrador” na cabeça. A primeira idéia foi a de comprar um. A segunda de escrever. Não que uma anula a outra, mas começo do final, que é mais fácil. Não sou pudica. Poderia perfeitamente entrar num sex shop e pedir um vibrador, ir para o caixa, pagar e sair com o pacote na mão, como quem sai da padaria com uma baguete. A complicação está nos detalhes. Se eu chegar na loja e não tiver o vibrador que eu quero bem ao alcance dos olhos? Daí tenho que chegar e dizer:“Por favor, você tem um maior? Ou menor? Ou preto? Ou mais fino? Ou mais grosso? Ou mais rápido? (...)Ah, tem com música? Que legal!!Nossa, e que caro...Sem música é mais barato? E mais fino e menor, é mais barato? E se for só manual, sem pilhas, custa quanto? .(...) Ah, tem razão, daí não é vibrador, é um pênis de borracha apenas....E vocês aceitam cheque pré-datado?”.....Pior ainda é se for com minha bolsa que tem as carinhas dos meus filhos estampadas. Daí a vendedora vai perguntar: são seus filhos? E eu vou dizer que são e me sentir imediatamente uma pervertida. Chego à conclusão de que se tiver que puxar muito papo para comprar o vibrador vou perder o tesão. Posso pedir pela internet. Vejo a foto, escolho o modelo, tamanho e mando despachar. O pênis chegaria pelo Correio, em embalagem discreta, como convém quando assuntos sexuais ameaçam territórios familiares. Mas daí escondo onde? Na gaveta? Não, Lala e Santi vivem abrindo as gavetas todas pra jogar as roupas para fora..Já imaginou pegarem o vibrador e jogarem escada abaixo? Não tenho muitos lugares para esconder. Uma caixa seria a opção. Mas minha empregada eficiente faz arrumação em tudo e não gostaria que soubesse que tenho um vibrador em casa. Lá no futuro, poderia usar isso contra mim no Tribunal. “Dona Luciana não me pagava em dia, me explorava, me deixava passar fome e tinha um pinto escondido numa caixa”. Viraria a patroa carrasca e tarada. Ganho de causa na hora.Posso deixar simplesmente o assunto para lá. Afinal sexo não é tudo na vida. Parece que a gente nunca está mesmo satisfeita nessa vida. Quer dizer que além de ter o que comer, ter um emprego fixo, ter filhos maravilhosos, uma casa confortável, um carro que quase sempre funciona eu ainda quero ter orgasmos? Poderia aproveitar o tempo de ociosidade que usaria para meu solitário kama-sutra para entrar na ginástica, natação ou para dormir mais e me livrar dessas horrendas olheiras. Mas não. Nessa altura do campeonato, com tudo organizado, minha rotina quase britânica, resolvo que quero ter orgasmos também. Andei tendo uns outro dia, mas foi vendo um canal adulto, um desses filminhos pornôs, logo depois que acabou minha novela favorita, Belíssima, é o nome. Realmente não entendo porque minha cabecinha fértil, agora que parece que tudo está mais calmo, as crianças estão dormindo mais e eu poderia me dedicar a tantas outras coisas, resolve só pensar em sacanagem. E não adianta ninguém me aconselhar a arrumar alguém de verdade. Isso demandaria mais tempo da minha apertada agenda, mais diplomacia e realmente daí não teria como colocar o amante na gaveta ou na caixa quando começasse a me encher o saco. Quero algo mais prático, simples, rápido e silencioso. Algo que combine bem com minha atual realidade de mãe sem marido, assalariada e cabeça aberta. Por isso, optei por escrever.
(abril de 2006)

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